Entre Bares

Acordei e era domingo. A música do vizinho não engana. Mas não dormi bem essa noite. O amor é tão difícil quanto bonito. Vi o domingo nascer e fiquei imaginando em quantos domingos eu vi nascer em noites de boemia. Algo em mim ficou mais velho e já não fico até tão tarde do amanhecer pela rua. A festa acaba cada vez mais cedo. Por outro lado o dia parece maior.

Imagino quantas mães de família devem está indo fazer as compras do almoço de domingo, sempre especial. Imagino quem está indo dormir depois de tanto beber e quantos estão acordando disposto a encher a cara – pois é domingo meu caro! Penso no amor que me dá dor de cabeça. Penso penso até que levanto. Vou ao banheiro me olho no espelho com a cara de quem estava bêbado. Estou bêbado de não ter sono. O amor, quando quer, leva a fome o sono e que mais dé na telha.

Enrolo até não poder mais. Levanto ligo o computador e um monte de trabalho me assusta. Penso que hoje é domingo e eu não devo cair na armadilha do trabalho. Amanhã tem trabalho de novo, é segunda e aí não dá para escapar. Por hoje não, nada de trabalho. Procuro ouvir música. De novo Chico e Caetano me preenchem o domingo. Assim não parecem fora do tom os gritos, o choro de crianças e outros exageros dominicais. Ouço Chico e tudo passa ao largo. Fico cantarolando um sambinha, ou me perco num verso de Caetano.

Só quem nunca amou de verdade pode achar o amor uma maravilha. Acho que é preciso amar o amor, para poder ficar de bem com ele. No fundo, entre o inicio e o fim do amor há um monte de coisas belas e estranhas. O ciúme e o beijo são igualmente verdadeiros. E igualmente têm algum sentido – no inicio no meio e no fim. Feito um beijo de despedida e uma saudade amarga, com ciúme e paixão. Sofrer de amor no domingo é a pior forma de dor.

Não dá para chorar sozinho aos domingos. Tem gente demais por perto. Não dá para falar sozinho. Alguém escuta e diz:

– Quê?

– Nada, eu tava falando sozinho.

Domingo sem ressaca. Com sono. Sem amor. Deve ser uma pagação de pecado. Depois de horas pensando numa imensidão de coisas que não eram nada resolvi sair e comprar um vinho. Esperar que ela ligue. Ou que eu fique bêbado e durma mais cedo. Amanhã é segunda. Tem trabalho e nem um segundo a perder. Segunda é um dia cheio e é melhor para sofrer de amor. Não dá tempo de pensar.